500 anos da Reforma de Lutero: sua relevância para a libertação dos oprimidos
por Leonardo Boff
Ao celebrarmos os 500 anos da Reforma Protestante de Lutero cabe considerar sua importância para o nosso tempo latino-americano e mundial. Face às opressões histórico-sociais, as várias Igrejas fizeram uma opção pelos pobres contra sua pobreza e em favor da liberação. Lutero enfrentou tempos semelhantes de conturbações sociais e da conhecida Revolta dos Camponeses (Bauerkrieg) entre 1524-1525 que mobilizou a Europa Central e teólogos como o famoso Thomas Münzer, considerado um dos primeiros formuladores da ideia de revolução, segundo o filósofo do princípio-esperança Ernst Bloch.
Atualizamos aqui um estudo feito há anos, pois entendemos que conserva sua vigência e nos serve como comemoração do jubilee de Lutero, lida a partir do tipo de teologia desenvolvida entre nós. Ulrich Duchrow, professor da Universidade de Heidelberg a este propósito reuniu recentemente vários estudos em três volume com o provocativo título: Warum de Reformation radikaler warden muss (Por que a Reforma deve ser mais radical).
A teologia da libertação, antes de ser uma doutrina com conteúdos mais ou menos definidos, apresenta-se como uma maneira de considerar as distintas matérias teológicas, vale dizer, uma outra forma de fazer teologia. Temos a ver com um método singular de realizar a reflexão da fé em confronto com a realidade conflitiva que vivemos.
A partir da opção pelos pobres, pela justiça social e do compromisso com acaminhada das comunidades cristãs que, motivadas pela fé, se empenham na mudança da sociedade, pode-se ler e reler grandes temas da tradição e interrogar personalidades-testemunhas do passado. O que elas nos têm a dizer, a confirmar, a criticar em nossa preocupação pela libertação dos oprimidos a partir da fé?
Lutero apresenta-se como uma das maiores testemunhas do espírito evangélico e da coragem de postular reformas na Igreja e na sociedade. Ele defrontou-se com grandes processos de mudança, com os príncipes que disputavam entre si poder e com os camponeses em rebelião.
Que tipo de prática desenvolveu Lutero? Como refletiu sobre as práticas históricas vigentes então? Que atitude queria para o seu movimento face às mudanças sociais? Estas questões não são as do Lutero histórico; são nossas, condicionadas pelo tipo de desafios vividos e sofridos por nós no contexto de uma América Latina em efervescência social e ecclesial e também da fase planetária da humanidade. Mas Lutero nos poderá quiçá servir de inspiração e também de crítica.
Para achegarmo-nos a ele, primeiramente, faríamos bem em interrogar os movimentos confessionais que remontam a Lutero e que guardam sua herança espiritual. Em seguida tentaremos dialogar com o próprio Lutero em suas obras mais diretamente ligadas à questão que nos interessa: a fé, a Igreja e a sociedade em transformação.
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O protestantismo histórico, promotor da liberdade da sociedade emergente, burguesa
Na América Latina, como é que se relacionam as “Igrejas históricas” protestantes (a Luterana e a Presbiteriana de orientação confessional e a Metodista e Batista de revival evangélico) com o processo popular de libertação dos pobres latino-americanos?[1]
Para compreender esta relação, importa situar historicamente a penetração do Protestantismo no Continente da América Latina. Começou a se fazer presente, ativa e organizadamente, a partir da metade doséculo XIX. Vinha dos países centro-europeus e do Atlântico Norte, especialmente dos USA. Portanto,vinha daqueles países pioneiros da “modernidade” e que detinham e detêm até hoje a hegemonia do projeto liberal e atualmente neoliberal, de vés radical. Chegando a nossos países, as Igrejas históricas traziam os ideais do liberalismo, ideais que, no aspecto econômico, reforçavam a modernização e industrialização contra as velhas oligarquias senhoriais da terra; em sua dimensão política levantavam a bandeira da democracia representativa; na vertente cultural disseminavam a escola para todos e a promoção do indivíduo, de sua liberdade e empreendedorismo.
Claramente o formulava o missionário presbiteriano Staniey W. Rycroft: “O Cristianismo (Evangelho), com sua ênfase no valor do indivíduo e na liberdade do espírito humano sob a disciplina de Deus, é o mais seguro alicerce para a liberdade e a democracia pela qual anseia a América Latina”.[2]
Com este propósito, o Protestantismo histórico quer reproduzir na América Latina, condições semelhantes às de seus países de origem do hemisfério norte. Para tanto, faz aliança estrutural (não é intencionalidade subjetiva, mas dentro do jogo de forças sociais) com os setores mais avançados da sociedade latinoamericana, influenciados pelos ideais da Revolução Americana e Francesa, do Iluminismo, do Positivismo e até da maçonaria. Trata-se da burguesia nacional, da pequena burguesia urbana, rural e comercial.
Este processo ocorre exatamente no momento em que ocorre a transição da sociedade latino-americana tradicional e colonial para a moderna e liberal. Explodem conflitos entre os velhos senhores e o novo sujeito histórico emergente. A Igreja Católica se alinhava ao bloco histórico senhorial e colonial. Vai constituir um inimigo que deve ser combatido fortemente pelos protestantes, não só pelas diferenças confessionais, mas por sua função social conservadora. Para o Protestantismo histórico, “o Catolicismo Romano é considerado a ideologia e estrutura religiosa de um sistema global, a caduca ordem hispânica senhorial, implantada na América Latina, que deve ser varrida para dar lugar a uma nova ordem democrática, liberal, ilustrada, dinâmica, que o Protestantismo historicamente inspirou e à qual a doutrina protestante – de livro aberto e com juízo próprio – abre o passo e sustenta”.[3]
Com efeito, o Protestantismo é inovador diante do pacto colonial do Cristianismo (Igreja Católico-Romana) com as forças do Império ibero-lusitano. E representa um apelo a uma vivência moderna da fé em articulação com o espírito imperante de liberdade, participação democrática e atualização do processo produtivo.[4] Em termos religiosos, mostrava-se como “fé viva” em contraposição à “fé morta” do Catolicismo, religião de tradições e exterioridades. Segundo Gonzalo Báez Camargo, Cristo na América Latina foi o “Cristo silencioso”, diante do “Cristo sem cadeados” dos protestantes.[5]
Por outro lado, deve-se reconhecer que a teologia protestante está ligada ao sujeito histórico liberal. O liberalismo se torna a ideologia do imperialismo dominador, criador de um centro e de uma periferia. Desde meados do século XIX se estabeleceu um neocolonialismo na América Latina; o protestantismo que viera no seio dos ideais liberais se transforma em fator legitimador deste pacto neocolonial. Significa um avanço diante da tradição colonial sustentada pelo trono e pelo altar.
Mas cabe reconhecer: não é libertador da estrutura fundamental de dominação. Os senhores mudaram, mas o sistema de sujeição e marginalização do povo continua seu percurso. A mudança social que o Protestantismo favorecia era só reformista; beneficiava diretamente os estratos médios e altos e bem escassamente as camadas populares, por via indireta. A transformação religiosa centrada na conversão do coração, em uma fé viva e em práticas éticas, apesar de personalistas, repercutia nos estratos modernos da sociedade. O povo continuava em sua religião popular e no drama de opressão social.
Acertadamente dizia Octavio Paz: “A ideologia liberal e democrática, longe de exprimir nossa situação histórica concreta, a escondia. A mentira política se instalou em nossos povos assim constitucionalmente. O prejuízo moral foi incalculável e atinge regiões muito profundas de nosso ser. Vemo-nos na mentira com naturalidade. Por mais de cem anos sofremos regimes de força a serviço das oligarquias feudais, mas que usavam a linguagem da liberdade”.[6] O Protestantismo histórico mantém uma relação muito íntima com essa ideologia liberal e o faz de modo natural e inconsciente.
Com a crise do projeto liberal, de um capitalismo dependente e periférico na América Latina, entrou em crise também a compreensão liberal do Protestantismo. Poderá ser uma força de libertação dos oprimidos?
José Míguez Bonino, eminente teólogo da libertação argentino, já falecido, formulou de modo consciente a seguinte tese: “Poderá o Protestantismo superar sua crise de identidade e missão se – e na medida em que – conseguir recuperar o papel subversivo que realizou no passado, mas na situação radicalmente distinta em que hoje nos encontramos”.[7] Júlio de Santa Ana, ex-membro do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), e conhecido teólogo uruguaio de libertação, hoje vivendo na Suiça, postula uma encarnação da Igreja e do Protestantismo no mundo dos pobres, para ajudar em uma transformação profunda e global, uma verdadeira libertação dos oprimidos.[8] Rubem Alves, outro teólogo da libertação, presbiteriano, também já falecido, distingue a função ideológica que o Protestantismo ocupou diante do liberalismo e sua permanente função utópica como memória da força libertadora do Evangelho. Nessa perspectiva, “católicos e protestantes estão se descobrindo como um só corpo em função de uma esperança na América Latina nova”.[9]
Na verdade, existe uma frente libertadora protestante de grande significação no processo global da prática libertadora e da reflexão que se constrói a partir dessa prática. Cabe agora perguntar em que medida Lutero pode corroborar nesta missão. Walter Altmann, professor de teologia sistemática de São Leopoldo, dedicou-lhe uma investigação minuciosa que ganhou ressonância no mundo inteiro, “Lutero e a Libertação”(Atica: São Paulo 1994)
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Lutero libertador na Igreja, reformador na sociedade
Queremos colocar a questão: até que ponto Lutero tem uma função libertadora no processo histórico-social-religioso e até que ponto em sua teoria e prática propiciou uma interpretação legitimadora da modernidade que tanta opressão traria às grandes maiorias empobrecidas de nossa época. Para responder a tal pergunta, necessário se faria uma investigação muito minuciosa sobre o fenômeno-Lutero em si e sobre sua incidência no conjunto de forças que vigoravam naquele tempo. Para isto não há tempo nem espaço nesta breve reflexão. Mas tentarei esboçar algumas linhas (incompletas) que nos podem ajudar a entender o desafio que os explorados nos lançam, a todos, como cristãos e como Igrejas.
Para refletirmos com certo sentido hermenêutico, temos necessidade de um quadro mínimo referencial. Assumo a hipótese (que não cabe aqui aprofundar nem justificar) de que um fenômeno religioso como o de Lutero não pode ser analisado só com as categorias religiosas. Quem procura fazer uma análise apenas religiosa acaba não fazendo sequer uma análise religiosa. Isto é assim porque o fator religioso (semelhantemente à cultura, às ideologias, aos valores) jamais se constrói sozinho, mas sempre em articulação com a história concreta e as estruturas econômico-políticas de uma sociedade.
Além de seu caráter específico, cada fator tem seu índice de eficácia própria sobre os demais; podem ocorrer momentos em que o fator religioso pareça dominante[10]; talvez seja este o caso da Reforma com Lutero. A Reforma é antes de tudo um fenômeno religioso, mas não somente ; no campo religioso se revelaram todos os níveis de conflito que perpassavam a sociedade e a consciência européia de então. Com razão, diziaHenrique Hauser: “A Reforma do século XVI teve o duplo caráter de revolução social e revolução religiosa. As classes populares não se sublevaram só contra a corrupção do dogma e os abusos do clero. Também se levantaram contra a miséria e a injustiça. Na Bíblia não buscaram apenas a doutrina da salvação pela graça, mas também a prova da igualdade original de todos os seres humanos”.[11]
É sumamente emaranhada a questão das causas da Reforma.[12] Ninguém se atreveria a reduzi-la a uns poucos fatores apenas. Mas o que podemos seguramente dizer é que os Reformadores, particularmente Lutero, responderam aos grandes anseios de seu tempo marcado por transformações profundas através do descobrimento de novos continentes, com a colonização de novas terras, a invenção da imprensa, a introdução de novos métodos financeiros, a emergência do humanismo e especialmente o grito de toda a Cristandade por reformas profundas na cabeça e nos membros (in capite et in membris).
Ante o campo específico (religioso) dentro do qual se movia, Lutero efetuou um grandioso processo libertador. Será ele para sempre uma referência obrigatória para todos os que buscam a liberdade e sabem lutar e sofrer por ela. Hegel, com razão, considera a Reforma Luterana uma “Hauptrevolution” (revolução fundamental), porque, “com Lutero, começa a liberdade de espírito”, liberdade que “não apenas se reconhece, mas é sumamente exigida”.[13].
Conquista-se essa liberdade rompendo com o “cativeiro babilônico” a que fora submetida a Cristandade sob a hegemonia da Roma dos Papas renascentistas que nunca primaram por bons costumes. Para identificar melhor a significação libertadora de Lutero dentro do campo religioso e daí sobre os demais campos da realidade, urge considerar rapidamente o lugar da Igreja dentro da formação feudal e senhorial daquele tempo.
a)Libertação do cativeiro babilónico da Igreja
Na Europa semifeudal e mercantil dos séculos XV e XVI, a Igreja constitui peça fundamental. A Sé Romana, os bispos, particularmente na Germânia, tinham grandes interesses econômicos, políticos, jurídicos e militares. Não se há de esquecer que o papa exercia grande poder temporal com inúmeros pactos e benefícios. No regime semi-feudal e de burguesia mercantil ocorriam relações de vassalos e súditos, de senhores e servos, de colonizadores e colonizados.
Particularmente para manter submisso o campesinado, apesar das muitas sublevações na Boêmia, Suábia, França e outras partes da Europa Central, não se recorria apenas à coerção armada mas também à persuasão religiosa.[14] Aristocracia feudal e sociedade burguesa mercantilista fizeram um pacto com o clero (que também tinha poder secular), de tal sorte que a Igreja se constituía na instância central da reprodução da sociedade semifeudal e mercantilista. Isto significa: a Igreja, em sua multifuncionalidade, consagra e solidifica as relações do status quo, de dominação. Essa especial função da Igreja se exerce com eficácia mediante mil tipos de obras piedosas, devoções a Santos, indulgências lucradas a dinheiro. Por exemplo, Lutero desaprovou o acúmulo em uma igreja, no castelo de Frederico o Prudente, de 17.413 relíquias cuja veneração, mediante pagamento, permitia auferir 128.000 anos de indulgência.[15] Todo esse processo de coligação da ordem dominante com o clero tinha seu centro de animação e legitimação última na Sé Romana e no papado todo ele tomado por corrupções.
Diante de tal situação, Lutero (que vinha de profunda crise espiritual, aliada a um desejo profundo de reforma em sua Ordem religiosa, os agostinianos, e na Igreja inteira) lançou o seu grito profético. Insurge-se contra o que ele – tantas vezes – chama de “tirania do papa”.
À justificação pelas obras opõe a justificação pela fé.[16] Faz a inaudita descoberta da misericórdia ilimitada de Deus em Jesus Cristo crucificado. O homem não se acha condenado a cumprir leis e tentar por suas boas obras produzir a salvação. Portanto, sua missão neste mundo não consiste em ajustar-se e reproduzir todas as normas, com a convicção de sua incapacidade visceral de fazê-lo perfeitamente.
Com a tese básica da justificação pela fé, Lutero introduz uma radical libertação, pois com isto quer dizer que o ser humano está livre de todas essas exigencies impostas pela Igreja dos clérigos a fim de estar livre para acolher a graça e a misericórdia como puro dom e oferecimento gratuito do Pai. Em conseqüência da graça e da pura fé (ato englobante de toda a existência é, por isso, algo mais que simples adesão intelectual a um código de verdades reveladas)[17], o ser humano produz boas obras. “Porque é bom produz obras boas; não é bom porque produz obras boas”, será uma afirmação básica de Lutero[18] que a encontrou já no Mestre Eckhart.[19]
A justificação pela fé é a expressão de incrível liberdade interior conquistada por Lutero e arvorada como bandeira de libertação para os outros cristãos. Em 16 de abril de 1521, quando Carlos V o convocou à Dieta de Worms, convidando-o a abandonar sua proclamação, Luterores pondeu: “Não posso nem quero retratar-me, porque não é bom nem sincero agir contra a própria consciência. Que Deus me ajude! Amém! Instado pela última vez pelo oficial que disse: “Deixa tua consciência, irmão Martinho: a única coisa que não oferece perigo é submeter-se à autoridade estabelecida”, Lutero recusou definitivamente.[20] Lutero não mostra deferência servil a nenhuma autoridade terrena como última instância; última instância só pode ser Deus; e Deus é um Soberano insubstituível, e o papa Seu servidor.
Os textos produzidos em junho (O papado de Roma), em agosto (Apelo à nobreza cristã da nação alemã), em outubro (O Cativeiro babilônico da Igreja) e novembro de 1520 (A liberdade do homem cristão) produzem inegável aura de libertação. Insistimos: evidentemente, a tematização é religiosa, mas o seu efeito é também social, político, econômico, porque a Igreja perpassava todas estas instâncias como a instituição básica de coordenação, hegemonia e reprodução do sistema vigente.
Na obra O papado de Roma define a intuição fundamental da eclesiologia protestante. A Igreja visível (corpus christianorum) é puramente humana e não pode identificar-se com o Corpo Místico de Cristo. A Igreja de Cristo é como o Reino que está dentro de nós, é invisível, espiritual e interior.
Na obra tremendamente virulenta contra o clero e o papa Apelo à nobreza cristã da nação alemã, na perspectiva da convocação de um Concílio para a reforma da Igreja, denuncia os três muros dos romanistas que impedem a liberdade dos cristãos:
1) A superioridade do estado religioso sobre o civil (geistiicher Stand – weltlicher Stand) mediante a qual o papa pretende dominar a todos. O poder na Igreja é unicamente espiritual e significa função de serviço e permanece enquanto realiza o serviço; fora dessa inserção diaconal, permanece e volta a ser leigo: “O caráter indelével são palavras e leis inventadas pêlos homens”.[21] Aqui é que Lutero defende a vigência permanente do sacerdócio universal de todos os leigos.
2) O outro muro é o direito que o papa se arroga de interpretar sozinho as Escrituras; Lutero, que dominava maravilhosamente os textos sacros (sua tradução da Bíblia, genial na correção e simples no estilo, teve 84 edições no seu tempo e 253 depois de sua morte), afirma o direito ao acesso individual ao texto, a iluminação do Espírito em sua interpretação e assim quebra o monopólio da legitimidade de interpretação e abre caminho para o livre exame. Por fim.
3) o terceiro muro, a pretensão do papa de somente ele poder convocar e reconhecer um Concílio. Na base de textos escriturísticos e de testemunhos da Tradição, Lutero reivindica o direito dos príncipes de convocar um Concílio e urgir uma reforma na Igreja, inclusive “para ensinar ao papa que ele é um homem e não Deus, ao Qual deve manter-se submisso”.[22]
No Cativeiro babilônico da Igreja denuncia as formas como o corpo sacerdotal se apoderou dos sacramentos mediante os quais mantém na sujeição todos os fiéis. “Todos eles foram reduzidos a um mísero cativeiro pela Cúria Romana. A Igreja se viu privada de toda a sua liberdade”.[23] Aceita e defende três sacramentos como tais: o Batismo, a Penitência e o Pão. Os demais são ritos eclesiásticos emf unção da vida e da organização comunitária, que têm legitimidade como construções religiosas humanas, mas não como expressão da vontade divina.
Para Lutero, o sacramento é também Evangelium, isto é, concretização da Palavra da promessa. Sem o elemento sacramental, a promessa fica “nuda promissio”. Mas o sacramento jamais é puro sinal, e sim um sinal que contém a promessa. Por isso, ainda segundo Lutero, não é o sacramento (sinal) que comunica a salvação, mas a fé no sacramento (que contém a promessa).[24]
Quanto à Missa, Lutero reivindica as duas espécies (pão e vinho) para o povo e lamenta que se diga em latim, incompreensível. O ministro não renova o sacrifício da cruz, mas comemora a promessa de perdão dos pecados, “promessa confirmada pela morte do Filho de Deus… Se é promessa, não chegamos a ela por nenhuma obra, por nenhum esforço ou mérito, mas somente pela fé (sola fides), pois onde está a Palavra de Deus que promete, aí se faz necessária a fé que constitui o princípio de nossa salvação”.[25]
O cativeiro que Roma impôs a este Sacramento foi convertê-lo em meio de negócio com missas votivas, encomendadas e sufrágios. Especialmente duro se mostra Lutero contra a Ordem como sacramento (apesar de aceitar o rito eclesiástico para introduzir os ministros na comunidade): “O Sacramento da Ordem tem sido e continua sendo uma belíssima maquinação para consolidar todas as monstruosidades que até hoje se cometeram e ainda se cometem na Igreja. Aqui desaparece a fraternidade cristã, aqui os pastores se transformam em lobos, os servos em tiranos, os eclesiásticos em mais que mundanos… Os clérigos não só creem que são mais que os leigos cristãos, que são ungidos pelo Espírito Santo, mas até os consideram cães indignos de ser contados juntamente com eles na Igreja”.[26]
A liberdade do homem cristão é um dos mais belos textos da tradição cristã que Lutero, junto com uma carta, enviou ao Papa Leão X. Todo ele se articula em duas proposições: “O cristão é um homem livre, senhor sobre todas as coisas e a ninguém submetido. O cristão é um servo obediente a todas as coisas e submetido a todos”.
O livro é uma apologia da libertação interior: o homem de fé se sente livre de toda preocupação por sua salvação, por observar preceitos e outros imperativos, porque sabe que a salvação lhe é oferecida gratuitamente por Deus. Em função desse dom, tem mãos e olhos e coração livres para trabalhar em prol de seusi rmãos, por puro amor a eles.[27] A última frase de seu livro resume bem a perspectiva: “O homem cristão não vive em si mesmo mas em Cristo e em seu próximo: em Cristo pela fé, no próximo pelo amor… Esta é a verdadeira e espiritual liberdade cristã, que liberta o coração de todos os pecados, leis e mandamentos, liberdade que supera qualquer outra liberdade, como o céu à terra”.
No De servo arbítrio (escrito em 1525, contra o De libero arbítrio, de Erasmo) mostra que a liberdade humana não pode afirmar-se diante de Deus; sua função consiste em acolher a ação salvífica de Deus; por si mesma a vontade humana não pode nem consegue elaborar e sustentar sua relação com Deus[28]; esta provém da livre iniciativa da misericórdia divina. Mas nas coisas da vida neste mundo se exerce a determinação humana, e uma vez agraciada pode livremente colaborar com Deus na construção de Seu Reino.[29]
Concluindo este item, devemos reconhecer que, apesar dos tremendos excessos verbais, juízos parciais e, por vezes, errôneos, Lutero significa a presença da autêntica profecia, exigindo conversão e reforma de toda a Igreja. Soube colocar o Evangelho e a Cruz como marcos de referência fontais para livrar a Igreja de todo o tipo de abusos do poder sacro e de manipulação das doutrinas a serviço do dominium mundi.
Não se pode negar uma aura de liberdade que pervade os principais textos de Lutero e que se transformou em fermento de libertação no seio do corpus christianorum. Sabemos que Lutero jamais teve a pretensão de criar uma confissão cristã paralela. Isto foi obra dos príncipes alemães a partir da Aliança de Torgau (1526), para enfrentar uma liga de príncipes católicos, selada definitivamente em março de 1551 pela Liga de Smalkalda. Quando se assinou a Paz de Augsburgo em 1555, já encontramos a Alemanha dividida entre Luteranismo e Catolicismo romano, sob o princípio cujus régio, heujus religio.
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b) A apropriação do espírito protestante pelos novos senhores
A atuação de Lutero foi libertadora dentro do campo religioso. A incidência na política não seguiu a mesma lógica. A Igreja Romano-Católica perdeu o monopólio religioso e passa a se reposicionar dentro de um campo religioso dividido; sua influência social diminui e tem que enfrentar a competição no confessional e também no político da parte dos príncipes que se bandearam para o Luteranismo (boa parte das regiões nórdicas).
Lutero mesmo não tINHA condições de controlar o movimento que desencadeou. Nem sequer teve consciência de sua incidência sócio-política; nem se lhe deve pedir, porque isto transcende os limites da “consciência possível” daqueles tempos recuados.
Assim o dizia claramente Lutero: “Meu Evangelho não tem nada que ver com as coisas deste mundo. É uma coisa bem à parte que tange unicamente às almas e não é de minha competência dar solução e despacho aos negócios temporais; para isto, existem pessoas com vocação, o imperador, os príncipes e as autoridades. E a fonte de onde devem tirar sua sabedoria não é o Evangelho e sim a razão, o costume e a equidade”.[30]
A falta de uma articulação consciente aparece ao irromper a Guerra dos Camponeses, liderados pelo pregador Thomas Müntzer (1489-1525).[31] A sublevação se insere dentro de um movimento maior que é bem anterior à Reforma. A situação dos camponeses no começo do século XVI é bastante boa.[32] Batiam-se pela reivindicação por mais direitos fundamentais no terreno sócio-político, como se vê no documento dos Doze Artigos. A seu movimento se associam, por isso, não só pequenos senhores, mas também abades, príncipes e bispos (Fulda, Bamberg, Espira).[33] Tendo que tomar posição, Lutero escreveu em abril de 1525 uma Exortação à paz. Diz claramente aos senhores: “Não são os camponeses que se sublevam contra vós, mas Deus mesmo”, e aos rebeldes: “Quem usa a espada morrerá pela espada; embora os príncipes sejam maus e injustos, nada vos autoriza a rebelar-vos contra eles”.
Lutero não é em nível político um revolucionário.[34] Fundamentalmente é respeitador do poder secular, porque vê nele instâncias instituídas por Deus, a que se deve obedecer. Explicitamente em 1521, em Wartburg, se pronuncia contra a rebelião e a sedição: “Eu me oponho e quero sempre opor-me aos que usam de violência, por mais justa que seja, porque a rebelião não se satisfaz a não ser com a efusão do sangue inocente”.[35]
Com razão, conclui o conhecido historiador Jean Delumeau: “A revolta dos camponeses mostrou bem claramente a incompetência política do Reformador. Especialmente o fez perder a fé no povo organizado em comunidades. Desde aquele momento tendia a pedir aos príncipes a instituição do culto reformado. Ao Lutero da ‘liberdade cristã’ sucedeu o Lutero da ‘Igreja do Estado’ (Landeskirche)”.[36]
Para verificar a incidência do religioso sobre o sócio-político, deve-se perguntar pelos aliados que o movimento religioso evocou. No caso de Lutero, podemos seguramente dizer que mais que o povo pobre, foram os camponeses e servos da gleba, os príncipes, os humanistas e artistas (Dürer, Cranach e Holbein) e os burgueses urbanos.
O projeto histórico incrustado em suas práticas se orientou menos na linha de uma libertação, do que de acumulação de riquezas e privilégios. Max Weber mostrou a conaturalidade que vige entre Protestantismo e Capitalismo.[37] A vivência da fé em moldes protestantes é funcional ao estabelecimento e expansão do modo de produção capitalista. “Na medida em que o mundo ocidental se rege pela lógica do Capitalismo, podemos concluir que o Protestantismo se sente neste mundo como em casa, ao passo que o Catolicismo se percebe como no exílio. A ideologia protestante unifica a liberdade do indivíduo, a democracia liberal e o progresso econômico como expressão do espírito protestante. Em suma: o mundo moderno é fruto do Protestantismo”.[38]
A associação histórica do Luteranismo com os príncipes e a burguesia vitoriosa fez com que o Protestantismo incorporasse e assim legitimasse os interesses e ideais sociais desta classe.
Paul Tillich, eminente teólogo, vindo da sociologia, viu muito bem o enorme desafio posto ao Protestantismo moderno pelo proletariado e sua causa. Diz ele que “sob muitos pontos de vista até parece que o Protestantismo e a situação operária não têm nada a ver um com a outra… A situação proletária, na medida em que representa o destino das massas, é refratária a um Protestantismo que, na sua mensagem, confronta a personalidade individual com a necessidade de fazer uma decisão religiosa e a deixa entregue a si mesma na esfera social e política, considerando que as forças que dominam a sociedade foram ordenadas por Deus”.[39]
O famoso individualismo protestante se sente impotente e mudo diante de estruturas de injustiça. Na medida em que não reflete evangelicamente sobre esse desafio, corre o perigo de mascarar os conflitos que atormentam os pobres e assim não trazer uma colaboração para a tarefa messiânica de libertação dos condenados da terra.
Voltando à pergunta que púnhamos ao falar do Protestantismo na América Latina, devemos dizer que se confirmam as suspeitas segundo as quais mal existe uma articulação, em nível social, entre Protestantismo e libertação dos pobres. Ela existe na medida em que esta articulação deve ser montada a partir de algumas intuições de Lutero e especialmente de seu espírito francamente libertário dentro da Igreja.
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O evangelismo protestante como fator de libertação dos oprimidos
Em primeiro lugar, deve-se atentar bem para o fato de que a nossa situação se acha profundamente modificada quando a comparamos com a do tempo de Lutero. Naquele tempo a Igreja era a principal peça de reprodução do sistema social, de modo que as mudanças introduzidas por Lutero no campo religioso puderam repercutir imediatamente sobre o social. Hoje, a religião ocupa papel subsidiário.
Em nossas sociedades de capitalismo, apesar de periférico e excludente, a atividade econômica constitui a atividade central e organiza hegemonicamente todas as outras, produzindo imensa marginalidade para o povo empobrecido. Isto significa que uma possível libertação não vem com mudança dentro do campo religioso sem uma explícita articulação com os demais, em nossa conjuntura, mais determinantes e dominantes. É a partir do sócio-político e em permanente conexão com ele que o fator religioso pode mostrar-se libertador. Queremos apontar alguns pontos,ricos de conteúdo libertador, do evangelismo protestante.
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a) O princípio protestante
Paul Tillich cunhou esta expressão[40], para exprimir a intuição fontal de Lutero: o princípio protestante. Ele se sublevou, em nome do Evangelho, contra a prepotência do poder sagrado da Igreja dos papas e do clero, contra o condicionado que usurpava a condição de incondicionado, contra o histórico que se apresentava como divino. O espírito protestante desmascara os ídolos religiosos e políticos e se recusa a simplesmente legitimar o status quo. Tudo tem de entrar em processo de conversão e mudança, isto é, deve libertar-se de todo tipo de opressão, para ampliar o espaço da liberdade para Deus e para a ação livre do ser humano. O princípio protestante vai ajudar os próprios protestantes a se libertarem de seu moralismo burguês para se apoiarem no radicalismo evangélico, como o fez Lutero.
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b) Recuperação do potencial libertador do Evangelho
A mais alta significação de Lutero foi sua profunda vinculação bíblica e evangélica. Num tempo em que o Evangelho era presa das elites ilustradas e clericais, Lutero o resgatou como viva vox e o entregou às mãos do povo. Na América Latina, o Evangelho é lido e meditado em centenas de círculos bíblicos e milhares de comunidades eclesiais de base como a grande fonte de contestação profética do sistema de exploração e de compromisso libertador. O potencial libertador das Escrituras emerge quando são lidas à luz das perguntas que vêm da conflitividade social e do grito do oprimido. Este intercâmbio entre Palavra de Deus e palavra da vida empobrecida e humilhada recupera a atualidade permanente da revelação e da ação salvadora de Deus instaurando seu Reino contra as artimanhas do anti-Reino. Neste ponto Lutero é uma referência irrecusável de libertação integral.
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c) A fé que deslancha obras de libertação
Lutero nos ajuda a todos a entendermos que a libertação deslancha a partir do dom de Deus que antes de qualquer ato histórico, por parte dos homens, toma a iniciativa. Essa consciência não desmobiliza as pessoas em seu engajamento de luta. Ao contrário, as estimula com mais força a se lançarem na produção de boas obras na medida em que libertam o próximo. Neste sentido, Lutero contrasta a fides abstracta vel absoluta (fora das boas obras) com a fides concreta, composita seu incarnata (ativa nas boas obras).[41]
Em função disto, pode Lutero falar de Cristo “actuosissimus” em seus membros que assimilaram as atitudes de Jesus Cristo e assim levam uma vida convertida e libertada.[42] Numa expressão concreta, sublinha que a fé deslancha por meio das obras feitas a partir do dom e da misericórdia.[43] Essas obras hoje não se podem reduzir ao âmbito da subjetividade sem repercutirem sobre as estruturas da sociedade.
Para garantir eficácia à ação que nasce da fé, deve-se antepor uma análise dos mecanismos produtores de opressão e definir os passos concretos que visam alibertação. Nisto, tanto os católicos como os protestantes, devemos aprender a nos fazer discípulos de uma prática teológica diferente que saiba sem servilismos nem paralelismos articular o discurso da fé evangélica com o discurso social da tradição crítica. É dentro desta conexão que emerge o potencial libertador da fé cristã.
Para concluir, queremos fazer nossas as palavras da Comissão Mista Católico-Luterana Internacional, em seu documento de maio de 1983: “Consideramos conjuntamente a Lutero como testemunha doEvangelho, mestre da fé e voz que chama à renovação espiritual”.[44]
Para nós, que vivemos na América Latina, o Evangelho necessita ser vivido de forma libertadora, a fé como produtora de um compromisso com os mais necessitados a partir da experiência da misericórdia primeira de Deus e da renovação espiritual como uma mística que una fé e política e construa a comunidade a partir de baixo, dos mais humildes, para que seja deveras a comunidade messiânica que prolonga a missão redentora e libertadora do Messias, cheio do Espírito, Jesus Cristo.
Essa passo foi dado nos encontros do Papa Francisco com a Confederação Mundial Luterna Igreja na Suécia em 31 de outubro a 1º de novembro de 2016 onde irrompeu a possibilidade de uma reconciliação, respeitadas as diferenças, sempre em benefício da humanidade e da salvaguarda da Mãe Terra e de nossa civilização ameaçada pela violência intrínseca ao sistema anti-vida capitalista que tomou conta do mundo. Esta grave situação de nossa realidade mundial, tem facilitado a convergência e a soma de esforços de todos os portadores da herança de Jesus na perspectica da justiça, da paz e da preservação do Criado ou na linguagem do Papa Francisco “no cuidado da Casa Comum”(2015).
Notas de rodapé
[1] Cf. Vários, Protestantismo y liberalismo en América Latina, San José de Costa Rica (DEI), 1983; E. Willems, Followers of the New Faith: Culture change and the ríse of Protestantism in Brazíl and Chile, Nashville, 1967; W. R. Reed, V. M. Monterroso, H. A. Johnson, Avanceevangélico en América Latina, Dálias, 1970; Ch. L. D’Epinay, El refugio de Ias masas: estúdio sociológico dei protestantismo chileno, Santiago, 1968; W. A. César, Por uma sociologia do Protestantismo brasileiro, Petrópolis, 1973.
[2] Religión y fé en América Latina, México, 1961, p. 10.
[3] Cf. J. M. Bonino, Historia y misión. Los estúdios históricos dei cristianismo en América Latina con referencia a Ia búsqueda de liberación, em Protestantismo y liberalismo en América Latina, op. cit., p. 25.
[4] Cf. R. Alves, Protestantismo e repressão. São Paulo, 1979, p. 38-42: “O protestantismo como vanguarda da liberdade e da modernidade”. Alves exprime sua autoconsciência de um fiel protestante: “Se perguntarmos à história: De que lado estás? Qual é o teu destino? Ela responderá: O catolicismo é o passado de onde venho. O protestantismo é o futuro para onde caminho” (p. 38).
[5] Citado por C. Alvarez, Dei protestantismo liberal ai protestantismo liberador, em Protestantismo y liberalismo en América Latina, op. cif., p. 49.
[6] Cf. El laberinto de Ia soledad, México, 1974, p. 99.
[7] Historia y misión, op. cit., p. 31.
[8] Protestantismo, cultura y sociedad, Buenos Aires, 1970, p. 110-127.
[9] Función ideológica y posibilidades utópicas dei protestantismo latinoamericano, em De Ia Iglesia y Ia sociedad, Tierra Nueva, Uruguai, 1971, p. 21.
[10] Para toda esta questão, cf. a obra fundamental de O. Maduro, Religião e luta de classes, Petrópolis, 1981; ainda M. Godelier, Marxisme, anthropologie et religion, em Epis-témologie et marxismo. Paris, 1952, p. 209-265; H. Portelli, Gramsci y Ia cuestión religiosa, Barcelona, 1977, p. 58-64.
[11] Etudes sur Ia Reforme Française, Paris. 1909, p. 83.
[12] Ainda clássica é a obra de J. Lortz, Wie es zur Spaltung kam. Von den Ursachen der Reformation, em Die Reformation ais religioeses Aniiegen heute, Tréveris, 1948, p. 15-105, ou então em Die Reformation in Deutschiand I, Friburgo, 1949, p. 3-20; H. Loe-we, C.-J. Roepke (Hg.), Luther und die Folgen, Munique, 1983.
[13] Vorlesungen über die Geschichte der Philosophie III (Suhrkamp, Werke 20), Frank-furt, 1971, p. 49, 50, 51.
[14] Cf. O. Maduro,A religião no regime semifeudal da Colónia, em Religião e luta de classes, op. cif., p. 87-90.
[15] Cf. I. Delumeau, La reforma, op. cit., p. 32.
[16] Cf. O. H. Pesch; Theologie der Rechtfertigung bei Martin Luther und Thomas von Aquin. Versuch emes systematísch-theologischenDialogs, Mogúncia, 1967; Idem, Hinfueh-rung zu Luther, op. cit., p. 264-271.
[17] Para uma exposição deste conceito de fé em Lutero, cf. G. Ebeling, Lutero, un volto nuovo, Brescia, 1970, p. 145-159.
[18] WA IV 3,28s; 56.3,13s; 4,11; 172.8; 268,4s.
[19] Cf. Mestre Eckhart: a mística de ser e de não ter (org. L. Boff), Petrópolis, 1983. p.104-105; 111-114.
[20] Citado por J. Delumau, La Reforma, op. cif., p. 35.
[21] Segundo a ed. de Wilhelm Goldmann Verlag, Munique, 1967, p. 38.
[22] Idem, ibíd., p. 76.
[23] Usamos a edição brasileira da Editora Sinodal, São Leopoldo, RS, 1982, p. 14.
[24] WA VI, 572,11; 550,9.25.
[25] Do cativeiro babilônico da Igreja, São Leopoldo. RS, 1982. p. 36-37.
[26] Idem, p. 126-127.
[27] Para toda esta questão, cf. W. Maurer, Von der Freíheít eines Christenmenschen. Zwei Untersuchungen zu Luthers Reformationsschriften 1520-1521, Goettingen, 1949.
[28] Para Lutero, a compreensão defendida por Erasmo de Roterdã, sobre o livre-arbítrio, levava a uma excessiva autonomia diante de Deus. Assim definia Erasmo o liberum arbitrium: “a força da vontade humana mediante a qual se pode dirigir para aquelas coisas que levam à salvação ou dela se afastam”: Diatribe seu collatio de libero arbítrio I b, 10,7-10.
[29] Quanto a este ponto, cf. WA XVIII, 695,29; 754,1-17; M. Seils, Der Gedanke vom Zusammenwirken Gottes und des Menschen in Luthers Theologie, Guetersioh, 1962.
[30] W A XVII, 321.
[31] Cf. M. M. Smirin, Die Volksreformation des Thomas Müntzer und der grosse Bauernkrieg, Berlim, 1956; P. Althaus, Luthers Haltung im Bauernkrieg, Basileia, 1953.
[32] J. Lortz, Die Reformation m Deutschiand I, op. cif., p. 322.
[33] Idem, p. 324.
[34] G. Casalls, Luther et 1’Egïise confessante, Paris, 1983, p. 82.
[35] Citado por G. Casalis, op. cit., p. 82. Lutero era amigo de chefes da repressão dos camponeses, como Felipe de Hessen, e lhes disse: “É necessário estrangulá-los. É necessário matar o cão enlouquecido, que se lança contra ti: senão, ele te matará” (em Contra as quadrilhas ladras e assassinas dos camponeses). Esta posição de Lutero se torna de difícil compreensão pelos oprimidos que não têm claramente o conceito de articulação da religião em uma sociedade de classes, religião que pode ser cooptada em função dos interesses do grupo hegemônico. No seu Comentário ao Magnificai Lutero mostra uma interpretação espiritualista, referindo-se aos ricos e poderosos e aos pobres e humilhados, nestas palavras: “Os famintos não são aqueles que pouco ou nada têm para comer, mas aqueles que, voluntariamente, curtem privações, principalmente se a isto são impelidos por outros por amor a Deus ou à verdade”. E dá motivos para não considerar as diferenças rico-pobre: “Deus não julga as pessoas pelas suas aparências. Pouco lhe importa que sejam ricas ou pobres, que ocupem posições de importância ou tenham situação social de menor projeção. O que Ele vê é o espírito que as anima. Na sociedade, sempre existirão privilegiados e deserdados. Os primeiros não devem apegar-se às vantagens de que gozam, e os segundos devem manter-se tranqüilos”: M. Lutero, O Magnificat, Petrópolis, 1968, p. 91-92; cf. também 82-87, o comentário espiritualizante do versículo: “derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes”. Aqui se percebe a ausência de uma análise das classes sociais, historicamente constituídas, coisa que ultrapassava a consciênncia possível não só de Lutero mas também de outros atores dos conflitos sociais daquela época.
[36] La Reforma, op. cit., p. 45.
[37] A ética protestante e o espírito do capitalismo, Barcelona, 1969.
[38] R. Alves, Protestantismo e repressão, op. cit., p. 42, referindo a autoconsciência dos protestantes.
[39] P. Tillich, .The Protestant Era, Chicago. 1962, p. 161.Leonardo Boff, teólogo ecumênico, filosofo e escritor
Leonardo Boff, teólogo, filósofo e escritor
Petrópolis, 21 de julho de 2017.
preciso falar com você Leonardo…olhe seus emails.
O ESPÍRITO SANTO ANDA SOLTO
Assim dizia Darcy Ribeiro sobre o tempo do Espírito Santo. Em nome do Pai, do Filho, do Espirito Santo e de toda criação completa Leonardo Boff. Lutero também dizia em seu estudo sobre o PAI NOSSO que o pior tipo de Cristão é o que está com a palavra SEMPRE continuamente na boca. Assim a ECLESIA SEMPER REFORMANDA precisa reconhecer seus limites. Embora JUSTOS E PECADORES precisem da SANTIDADE sem a qual ninguém verá a Deus. João Calvino na mesma linha dizia na COMUNHÃO DOS SANTOS que o batismo é a SUBMERSÃO DE NOSSO FARAÓ. Não se conhece nenhum santo protestante. Santo Agostinho e São Francisco de Assis são respeitados entre protestantes.
Mas, esta dialética protestante dos JUSTOS E PECADORES, SUBMERSÃO DE NOSSO FARAÓ carece mesmo de radicalidade. Católicos e protestantes da América Latina sofrem a
degradação das interpretações da fé e da prática que vem passando o Evangelho, desde a Judéia e Antioquia pela Ásia, África, Europa e América. Mas, TODA CRIATURA precisa ser alcançada até os CONFINS DA TERRA. O ESPÍRITO DE DEUS segue abrindo caminhos e futuros.
Eu, superficialmente, digo que a grande reforma de Lutero foi na área da educação. Pois, como propôs a livre interpretação bíblica, então todos deveriam aprender ler para processar tal interpretação. Logo, o que Lutero combateu foi o analfabetismo e não a estrutura teísta cristã (Deus pai, Deus filho e Deus Espírito Santo). Boff, que é o mestre dos mestres, é muito mais profundo nessa análise.
Republicou isso em Paulosisinno's Bloge comentado:
500 anos da Reforma de Lutero: sua relevância para a libertação dos oprimidos – Leonardo Boff
Caro Boff, sou profundo admirador de seus pensamentos e de seus textos, desde há muito, quando tomei conhecimento da teologia da libertação. Não venho aqui, por ora, acrescentar informação ou criticar o dito, apesar de ter cá comigo algumas pequenas divergências a respeito do Lutero histórico. Agora só tenho mesmo uma observação quanto à forma escolhida para a publicação de seus artigos. É que textos escritos em negrito são bastante cansativos de se ler, e como os que você publica, quase sempre, são um tanto extensos, a leitura acaba por não ter uma fruição tão agradável, apesar do assunto ser por demais interessante e de a argumentação ser muito eficaz. Por isso, se não for eu o único a sofrer com isso, venho aqui apenas sugerir que, ao publicar, não o faça com todo o texto destacado em negrito. No mais, caro Boff, tudo vai bem. Até uma próxima!
Alexandre, agradeço a observação e foi seguir seu conselho. abraço lboff
Republicou isso em Museu AfroDigital – Estação Portugal.
SUTILEZAS PORTUGUESAS
Conversas de julho giram em torno de viagens e mudanças.
Embora viagens e mudanças aconteçam mais no fim de ano.
Atualmente falou em viagem e mudança falou em PORTUGAL.
Tornou-se NATURAL a NATURALIDADE. Só não cabe e nem
tem cabimento todo mundo querer ir pra Portugal. Muito sutil!
Mas, é preciso aprender com os portugueses :EM TEMPOS DE
CRISES É PRECISO DAR PASSOS MAIORES…para não gastar
os sapatos, seu idiota ! O português de Portugal é diferente da
língua falada no Brasil recheada de natividades, afros, asiáticos,
europeus, americanos e oceânicos. O Brasil é multimilionário em
palavras, mas nã fala e nem sabe falar. E ainda quer falar Inglês e
ser como SUPREMA CORTE. Valha-me SÃO BERNARDO !!! Meu
neto querido que completa 1 ano dia 4 de agosto quando o Rev.
Cícero Siqueira da Silva da região nordestina do LULA completaria
120 anos que é o limite de vida dos tempos mosaicos.
Os tempos do ESPIRITO SANTO são SOLTOS.
Já dizia Darcy Ribeiro ao comentar as grande navegações do In-
fante D. Henrique que tinha a boa intenção da FÉ E ORDEM que
os Jesuítas queriam impor com a inquisição. O calvinista que os
portugueses mataram na Bahia na presença de José de Anchieta
deveria ser canonizado pelo Papa Francisco, pois João Calvino
escreveu A COMUNHÃO DOS SANTOS e até os dias de hoje não
existe SANTO PROTESTANTE canonizado. OS SANTOS DOS ÚL-
TIMOS DIAS ainda fazem um calendário próprio. Abaixo algumas
sutilezas portuguesas da era moderna que se atualizam na prática
pós-modernista :
ASSUMPÇÕES À BOCAGE
Certo dia, estava Bocage numa festa quanto uma senhora emitiu uma flatulência. Logo Bocage se ofereceu para assumir o acto. E então disse em voz alta: – O peido que esta senhora deu, não foi ela, fui eu…
Certo dia, estava Groucho Pinto de Mascarenhas a escrever um artigo quando cometeu um erro. Logo se ofereceu para assumir o acto. E então disse em voz alta: – O erro não foi só meu, aquele senhor também o cometeu…
Republicou isso em Zefacilitador.
Apenas um comentário singelo. Sobre a referência: “Rubem Alves, outro teólogo da libertação, presbiteriano […] “. Elucidando que Rubem Alves era de origem presbiteriana, mas se afastou completamente da denominação por motivos mesquinhos da liderança de seus contemporâneos, que refutaram suas teses e o perseguiram até seu completo afastamento.